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domingo, 6 de janeiro de 2008

EDResp 506.798/MG - MANDADO DE SEGURANÇA. TUTELA PREVENTIVA. IRPJ. CSLL. CORREÇÃO MONETÁRIA DE DEMONSTRAÇÕES FINANCEIRAS

EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RESP Nº 506.798 - MG (2004⁄0016115-5)
RELATOR : MINISTRO CASTRO MEIRA
EMBARGANTE : ZAMBONI DISTRIBUIDORA LTDA
ADVOGADO : DALMAR DO ESPÍRITO SANTO PIMENTA E OUTROS
EMBARGADO : FAZENDA NACIONAL
PROCURADORA : MÁRCIA HENRIQUES RIBEIRO DE OLIVEIRA E OUTROS

EMENTA
EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. TUTELA PREVENTIVA. IRPJ. CSLL. CORREÇÃO MONETÁRIA DE DEMONSTRAÇÕES FINANCEIRAS. ART. 30 DA LEI Nº 7.799⁄89. DECADÊNCIA. ART. 18 DA LEI Nº 1.533⁄51.
1. O mandado de segurança almeja, na origem, o afastamento da norma contida no art. 30 da Lei nº 7.799⁄89, que denegou a incidência do Índice de Preços ao Consumidor-IPC como fator de correção monetária das demonstrações financeiras, utilizadas na apuração da base de cálculo do Imposto de Renda e da Contribuição Social sobre o Lucro.
2. Não é qualquer temor ou sentimento de apreensão que autoriza a tutela preventiva no mandado de segurança. O justo receio a que alude o art. 1º da Lei 1.533⁄51, capaz de justificar a segurança, há de se revestir dos atributos da objetividade e da atualidade. A ameaça deve ser traduzida por fatos e atos, e não por meras suposições.
3. O ato coator, no particular, não pode ser qualificado como o primeiro de uma série de atos sucessivos e autônomos com idênticos fundamentos. In casu, o ato vergastado pelo mandado de segurança amolda-se à categoria de ato único com efeitos permanentes.

4. O acórdão paradigma, diante da premissa fática da ocorrência de uma lesão que se renova ano a ano, afastou o prazo decadencial de 120 dias para o ajuizamento do mandado de segurança preventivo. Já o aresto embargado reconheceu que a lesão apontada existiu no momento em que o contribuinte, por imposição fiscal, corrigiu o seu balanço, em 1989, pelo índice determinado pelo poder tributante, afastando a existência no caso de um ato que se renova anualmente.
5. A dessemelhança fática entre os acórdãos confrontados impede o prosseguimento dos embargos de divergência.
6. Embargos de divergência não conhecidos.

ACÓRDÃO


Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da PRIMEIRA SEÇÃO do Superior Tribunal de Justiça, "Prosseguindo no julgamento, a Seção, preliminarmente, por maioria, vencidos os Srs. Ministros Relator e Franciulli Netto, conheceu dos embargos. No mérito, por unanimidade, deu-lhes provimento, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator."A Sra. Ministra Denise Arruda e os Srs. Ministros Francisco Falcão, Franciulli Netto, Luiz Fux (voto-vista) e Teori Albino Zavascki votaram com o Sr. Ministro Relator. Não participaram do julgamento os Srs. Ministros Francisco Peçanha Martins, José Delgado e João Otávio de Noronha (RISTJ, art, 162, § º).

Brasília, 23 de fevereiro de 2005 (data do julgamento)


Ministro Castro Meira
Relator


EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RESP Nº 506.798 - MG (2004⁄0016115-5)
RELATOR : MINISTRO CASTRO MEIRA
EMBARGANTE : ZAMBONI DISTRIBUIDORA LTDA
ADVOGADO : DALMAR DO ESPÍRITO SANTO PIMENTA E OUTROS
EMBARGADO : FAZENDA NACIONAL
PROCURADORA : MÁRCIA HENRIQUES RIBEIRO DE OLIVEIRA E OUTROS


RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO CASTRO MEIRA (Relator): Cuida-se de embargos de divergência contra acórdão da Primeira Turma, exarado no Recurso Especial 506.798⁄MG, assim sumariado:


"PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. CORREÇÃO MONETÁRIA DE BALANÇO. APROVEITAMENTO. PRAZO DECADENCIAL. INTELIGÊNCIA DO ART. 18, DA LEI Nº 1.533⁄51.
1. A incidência do prazo decadencial de 120 dias (art. 18, da Lei nº 1.533⁄51) obsta a utilização do writ, de vez que o termo a quo desse lapso temporal instalou-se à época em que as autoras tomaram conhecimento do ato dito coator.
2. Não basta rotular de 'preventivo' o mandado de segurança para se afastar o fenômeno processual da decadência do direito. É absolutamente inviável o socorro mandamental que visa utilizar, no ano de 1994, diferenças de correção monetária de balanço do ano de 1989.
3. Recurso especial não provido" (fl. 270).

A Primeira Turma, ao apreciar a questão dos autos relativa à correção monetária das demonstrações financeiras do ano-base 1989, entendeu que o recorrente decaiu do direito à impetração do mandado de segurança, ao argumento de ser "absolutamente inviável o socorro mandamental que visa utilizar, no ano de 1994, diferenças de correção monetária de balanço do ano de 1989".

Com o objetivo de comprovar a divergência, o embargante traz à colação arestos da Segunda Turma - especificamente, o REsp 188.082⁄MG e o REsp 204.111⁄RJ, Relatora para acórdãos a Ministra Eliana Calmon, este último assim ementado:


"PROCESSO CIVIL - MANDADO DE SEGURANÇA - DECADÊNCIA - CORREÇÃO MONETÁRIA DAS DEMONSTRAÇÕES FINANCEIRAS - LIQUIDEZ E CERTEZA DO DIREITO.
1. A tese jurídica discutida reporta-se a fato ocorrido em 1989, quando foi usado índice de correção monetária no balanço daquele ano-base.
2. Ilegalidade que se protrai no tempo, sendo este mandamus preventivo, por se reportar ao reflexo daquela ilegalidade.
3. Mandado de segurança não atingido pela decadência.
4. Tese jurídica que não exige exame dos aspectos fáticos, mas a constatação de que houve reflexo do índice de correção monetária da Lei 7.799⁄89 no balanço do ano de 1994.
5. Recurso especial provido" (STJ - 2ª Turma, REsp 204.111⁄RJ, Rel. para acórdão a Min. Eliana Calmon, J. por maioria em 25.06.2002, DJU de 25.11.2002).

Entendeu a Segunda Turma, no aresto paradigma, que o direito à impetração não se encontra fulminado pela decadência, já que a questão relativa à correção monetária das demonstrações financeiras do ano-base 1989 renova-se ano a ano, a cada nova declaração do Imposto de Renda.

Em sua impugnação, sustenta a Fazenda Nacional, em síntese, ser impossível o manejo do mandado de segurança com o objetivo de utilizar diferenças dos demonstrativos financeiros do período de 1989, no ano-base de 1994. Alega, também, que o acórdão não é digno de reparos, pois ultrapassado o prazo de 120 dias, o direito que se quer proteger poderá ser discutido por outra via judicial que não o writ. Segundo a embargada, não houve ofensa aos artigos 1º e 18 da Lei nº 1.533⁄51 e a admissibilidade do recurso encontra óbice na Súmula 168 do STJ. Por derradeiro, pugna pelo não-conhecimento dos embargos de divergência.

É o relatório.

EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RESP Nº 506.798 - MG (2004⁄0016115-5)

EMENTA


EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. TUTELA PREVENTIVA. IRPJ. CSLL. CORREÇÃO MONETÁRIA DE DEMONSTRAÇÕES FINANCEIRAS. ART. 30 DA LEI Nº 7.799⁄89. DECADÊNCIA. ART. 18 DA LEI Nº 1.533⁄51.
1. O mandado de segurança almeja, na origem, o afastamento da norma contida no art. 30 da Lei nº 7.799⁄89, que denegou a incidência do Índice de Preços ao Consumidor-IPC como fator de correção monetária das demonstrações financeiras, utilizadas na apuração da base de cálculo do Imposto de Renda e da Contribuição Social sobre o Lucro.
2. Não é qualquer temor ou sentimento de apreensão que autoriza a tutela preventiva no mandado de segurança. O justo receio a que alude o art. 1º da Lei 1.533⁄51, capaz de justificar a segurança, há de se revestir dos atributos da objetividade e da atualidade. A ameaça deve ser traduzida por fatos e atos, e não por meras suposições.
3. O ato coator, no particular, não pode ser qualificado como o primeiro de uma série de atos sucessivos e autônomos com idênticos fundamentos. In casu, o ato vergastado pelo mandado de segurança amolda-se à categoria de ato único com efeitos permanentes.
4. O acórdão paradigma, diante da premissa fática da ocorrência de uma lesão que se renova ano a ano, afastou o prazo decadencial de 120 dias para o ajuizamento do mandado de segurança preventivo. Já o aresto embargado reconheceu que a lesão apontada existiu no momento em que o contribuinte, por imposição fiscal, corrigiu o seu balanço, em 1989, pelo índice determinado pelo poder tributante, afastando a existência no caso de um ato que se renova anualmente.
5. A dessemelhança fática entre os acórdãos confrontados impede o prosseguimento dos embargos de divergência.
6. Embargos de divergência não conhecidos.


VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO CASTRO MEIRA (Relator): A controvérsia posta nos embargos de divergência versa sobre a incidência do prazo decadencial de 120 dias para o ajuizamento do mandado de segurança preventivo.

Do voto-condutor do acórdão embargado, proferido pela Primeira Turma, colhe-se o seguinte entendimento:


"Ao impetrar o writ, o objetivo das autoras não foi outro senão o de assegurar a utilização, no ano de 1994, da diferença verificada nos demonstrativos financeiros relativos ao período-base de 1989, decorrente de índice de atualização monetária que não refletiu a real inflação do período. Destarte, aspiram o direito de contabilizar em 1994, para efeito de determinação das bases de cálculo do IRPJ e da CSLL, a diferença havida pela não aplicação do IPC⁄IBGE na correção das demonstrações financeiras de 1989.
Em outras oportunidades, esta Corte já se manifestou sobre tema semelhante e o meu posicionamento continua sendo o mesmo. Confira-se:

(...)

Na via estreita do Mandado de Segurança, a contagem do lapso decadencial se faz a partir do momento que se deseja amparar.
Segundo as lições do mestre Pontes de Miranda “se há ameaça e cessa, certamente não se pode argüir a ameaça que foi há mais de cento e vinte dias; pode-se argüir posteriormente, dentro do prazo de cento e vinte dias, qualquer ameaça posterior” (Comentários à Constituição, 1946, 2ª ed., vol. IV).
Depreende-se dos julgados reiterados desta Corte, a respeito do prazo decadencial para o ajuizamento da ação mandamental, que:
a) a partir do ato lesivo abre-se o prazo de 120 dias para a impetração;
b) do pedido não poderá constar direito excedente ao prazo de 120 dias anteriores ao ajuizamento do mandamus;
c) o direito localizado em momento anterior aos 120 dias poderá ser discutido por outra via judicial, que não o writ.
Desfigurada estaria a própria Lei do Mandado de Segurança se se pudesse perquirir atos anteriores ao prazo de 120 dias, o que conduziria ao absurdo de ficar em aberto a possibilidade de busca de proteção a atos ocorridos há meses, anos ou décadas pela via constitucional.
Se as autoras elegeram a via do mandamus para buscar proteção ao direito vindicado, devem estar conscientes de que ficam submetidas ao normativo que disciplina tal instituto – a Lei 1.533⁄51 –, não prejudicada a possibilidade da via ordinária se o pleito não lograr êxito.
Cada ato está submetido a um prazo decadencial. Entendimento diverso implicaria a atribuição de efeitos pretéritos à ação mandamental, o que é inviável. E é exatamente o que se identifica no presente caso, como exposta a pretensão pelas impetrantes desde a inicial.
Frise-se: o mandado de segurança é remédio adequado para afastar ofensa presente ou iminente a direito individualizado, particularizado, identificável, ou seja, retentor de plano dos pressupostos de liquidez e certeza exigidos pela lei.
Há, portanto, que ser repelida a apontada ofensa ao teor dos artigos 1º e 18 da Lei 1.533⁄51, dado à manifesta ausência de caráter preventivo da ação ajuizada.
Não basta rotular de “preventivo” o writ para se afastar o fenômeno processual da decadência do direito. É absolutamente inviável o socorro mandamental que visa utilizar, no ano de 1994, diferenças de correção monetária de balanço do ano de 1989.
Em se tratando de mandado de segurança preventivo, sem divergências, o entendimento expressado por esta Corte é na linha de que inexiste aplicação do prazo decadencial de 120 dias previsto na legislação infraconstitucional (art. 18 da Lei nº 1.533⁄51). Há variedade de precedentes e mais nenhuma discussão:
(...)

Ocorre que, como demonstrado, na espécie, a lesão apontada existiu no momento em que o contribuinte, por imposição fiscal, corrigiu o seu balanço, em 1989, pelo índice determinado pelo poder tributante.

Posto isso, nego provimento ao recurso ora examinado.

É o voto" (fls. 264⁄268).

Para confrontar a orientação preconizada nesse aresto, a embargante traz a colação o acórdão exarado no REsp 204.111⁄RJ, proferido pela Segunda Turma. Revela-se conveniente, para uma melhor compreensão da divergência, transcrever o voto-vista da Min. Eliana Calmon, senão vejamos:


"Trata-se de recurso especial interposto de acórdão que, examinando questão em torno da correção monetária das demonstrações financeiras ano-base 1989, considerou aplicável o IPC, como reconhecido pela Lei 8.200⁄91 e entendeu que as diferenças recolhidas a maior somente poderiam ser compensadas a partir de 1993, não tendo exorbitado o Decreto 332⁄91 ao regulamentar a lei, permitindo a compensação apenas com o Imposto de Renda e não com outros tributos.
Julgando embargos declaratórios, o Tribunal entendeu ter-se operado a decadência impetrada em 1994 para impugnar irregularidade fiscal ocorrida no exercício de 1989 e, ainda que tempestiva a impetração, considerou faltar ao objeto a necessária liquidez para ser discutido na estreita via processual.
O recurso especial indicou ofensa aos arts. 1º e 18 da Lei 1.533⁄51, além de divergir de julgados de outros Tribunais, sustentando as seguintes teses:
a)não houve decadência, pois o mandado de segurança é preventivo e visa impedir a cobrança de tributos que a recorrente deixou de pagar relativamente a junho⁄94, face ao cômputo na base de cálculo de despesa referente a período-base anterior; e
b)existe direito líquido e certo a proteger, podendo ser deduzida na via mandamental a questão da correta aplicação do IPC.
O feito foi distribuído ao Ministro Peçanha Martins e pedi vista para melhor me assegurar das circunstâncias fáticas e da tese jurídica.
No julgamento do REsp 188.082⁄MG, em 23⁄10⁄2001, também relatado pelo Ministro Peçanha Martins, emiti voto no sentido de que, na realidade, existiu um problema com a Lei 7.799⁄89, que veio protraída no tempo. Então, a cada exercício, aquela situação da citada lei veio se renovando, porque aquilo que não se resolveu em termos de correção monetária do balanço, que foi feito erroneamente, foi repercutindo nos exercícios seguintes no Imposto de Renda dos outros anos. O que se reclama não é o que se passou, mas sim a repercussão para o ano da impetração. De qualquer sorte, há de se verificar que, para aquele ano da impetração, ainda não existe nenhum ato por parte do Fisco que objetive a cobrança daquele imposto. A empresa está se antecipando no mandado de segurança, para pedir ao Judiciário que declare a legalidade daquela forma de corrigir o que ela está praticando no sentido de fazer uma correção monetária plena do balanço pelo índice do IPC, pois o índice que eles usavam era o IRVF.
Dentro dessa compreensão, tenho afastado o aspecto da decadência do mandado de segurança.
Esta tese restou vencedora e, portanto, lavrei o seguinte acórdão:

PROCESSO CIVIL - MANDADO DE SEGURANÇA - PRAZO DECADENCIAL - CORREÇÃO MONETÁRIA DAS DEMONSTRAÇÕES FINANCEIRAS.
1. A tese jurídica discutida nos autos diz respeito ao mecanismo usado na correção do balanço do ano-base de 1989.
2. Em se tratando de operação contábil que se protraiu no tempo, dirige-se a impetração à repercussão sobre o balanço do ano de 1993.
3. Como a impetração data de março de 1994, e a data-base das demonstrações financeiras é de dezembro de 1993, inexiste decadência.
4. Recurso especial conhecido e provido.

Quanto à tese em torno do art. 1º da Lei 1.533⁄51, o Tribunal entendeu que se era controversa a questão jurídica, na medida em que o expurgo inflacionário seria maior do que o entendido como correto pelo STJ, enquanto que a recorrente afirma que a questão não é fática, mas jurídica.
Também neste aspecto entendo que tem razão a recorrente, uma vez que a existência de expurgo inflacionário e o seu percentual vem sendo analisado nesta Corte como tese jurídica e, portanto, passível de discussão em sede mandamental.
Com estas considerações, peço vênia ao Relator, para dar provimento ao recurso especial."

Assim colocada a controvérsia, cabe fazer uma digressão sobre a decadência no mandado de segurança. O art. 18 da Lei nº 1.533⁄51 assim estabelece:


"Art. 18 - O direito de requerer mandado de segurança extinguir-se-á decorridos cento e vinte dias contados da ciência, pela interessado, do ato impugnado."

A propósito, convém rememorar a célebre distinção entre ato administrativo único de efeitos permanentes e atos administrativos sucessivos e autônomos. Nesse sentido, colaciona-se trecho do voto proferido pelo Min. Nelson Hungria no Mandado de Segurança 3.649 (RTJ 1⁄32), nos seguintes termos:


"Tenho para mim que, no tocante ao dies a quo do prazo de mandado de segurança, há que distinguir entre o caso de ato administrativo único, mas com efeitos permanentes, e o caso de atos administrativos sucessivos e autônomos, embora emanados em virtude de uma norma inicial idêntica. Na primeira hipótese, o prazo do mandado de segurança há de ser contado da data do ato impugnado; na segunda, porém, cada ato pode ser impugnado pelo writ e, assim, a cada qual corresponderá prazo próprio ou independente."

Essa diferenciação foi adotada em outro julgado da Suprema Corte. No Recurso Extraordinário 95.238⁄PR, o Pretório Excelso nos termos do voto do Relator, Min. Néri da Silveira, perfilhou o entendimento resumido na seguinte ementa:


"Mandado de Segurança. ICM. Alegação de ser indevida a cobrança do tributo, porque inconstitucional. Convênio, dispondo sobre a matéria. Termo a quo do prazo requerer o mandado de segurança. Cada cobrança de parcela indevida representa, em princípio, um ato coativo autônomo. Não se há de reconsiderar, nesse caso, a data da vigência do Convênio, para a verificação da decadência. Distinção entre ato administrativo único, mas com efeitos permanentes, e atos administrativos sucessivos e autônomos, embora tendo como origem norma inicial idêntica. Na primeira hipótese, o prazo do art. 18, da Lei do Mandado de Segurança deve ser contado da data do ato impugnado; na segunda, porém, cada ato pode ser atacado pelo writ e, assim, a cada qual corresponderá prazo próprio e independente. Não se cogita de impugnar Convênio-ICM, em tese. Inaplicável a Súmula 266. Conhecimento e provimento do recurso extraordinário, para que, afastada a decadência do afastada a decadência do mandado de segurança, o Tribunal a quo julgue o mérito do pedido" (STF, RE 95.238⁄PR, Rel. Min. Néri da Silveira, DJU de 06.04.84).

Feitas tais considerações, à luz da classificação dos atos administrativos acima tratada, impõe-se elucidar qual a natureza do ato de autoridade impugnado no presente mandamus.

Trata-se originariamente de mandado de segurança impetrado contra o Superintendente da Receita Federal de Minas Gerais, em que se pleiteia a incidência do Índice de Preços ao Consumidor-IPC como fator de correção das demonstrações financeiras, utilizadas na apuração da base de cálculo do Imposto de Renda e da Contribuição Social sobre o Lucro. Requer a impetrante o afastamento da norma contida no art. 30 da Lei nº 7.799⁄89, que assim dispõe: "para efeito da conversão em número de BTN, os saldos das contas sujeitas à correção monetária, existentes em 31 de janeiro de 1989, serão atualizados monetariamente tomando-se por base o valor da OTN de NCz$ 6,92".

De fato, não se pode cogitar de hipótese subsumível à Súmula 226 do STF, segundo a qual não cabe mandado de segurança contra lei em tese, pois, sem dúvida, aqui se trata de ato normativo de efeitos concretos, perfeitamente impugnável por meio da ação mandamental.

Entretanto, no particular, o ato impugnado não pode ser qualificado como o primeiro de uma série de atos sucessivos e autônomos com idêntico fundamento. Não é essa a hipótese dos autos. O ato legislativo vergastado pelo mandado de segurança amolda-se à categoria dos atos únicos com efeitos permanentes, cuja noção foi explicitada alhures.

Não se mostra pertinente ao caso a assertiva contida no acórdão paradigma (REsp 188.082), pois não se cuida aqui de operação contábil que se protraiu no tempo, e sim de ato administrativo único de natureza normativa e efeito permanente (art. 30 da Lei nº 7.799⁄89). Tratando-se de ato único de efeito permanente, em que pese o fato de a ilegalidade apontada prolongar-se no tempo, ainda assim será plenamente aplicável o prazo decadencial previsto no art. 18 da Lei nº 1.533⁄51.

Sendo assim, esclarecida a natureza do ato impugnado, não há como afastar-se a decadência no caso em apreço. Como já dito pelo saudoso Min. Nelson Hungria, na hipótese de mandado de segurança contra ato administrativo único com efeitos permanentes, o prazo do mandado de segurança há de ser contado da data do ato impugnado. Dessa forma, como a Lei nº 7.799⁄89 foi publicada em 11.07.89, e a ação restou aforada em 09.01.96, o prazo decadencial transcorreu in totum, não subsistindo direito à impetração do mandamus.

Quanto à alegação de que o mandado de segurança almeja tutela preventiva, sendo inaplicável, portanto, o prazo decadencial do art. 18 da Lei nº 1.533⁄51, os argumentos esposados pela recorrente não merecem acolhida.

Sabe-se que a tutela preventiva só pode ser obtida pela via mandamental, em caso de justo receio. No entanto, não é qualquer temor ou sentimento de apreensão que autoriza a tutela preventiva no mandado de segurança. O justo receio a que alude o art. 1º da Lei 1.533⁄51, capaz de justificar a segurança, há de revestir-se dos atributos da objetividade e da atualidade. A ameaça deve ser traduzida por fatos e atos, e não por meras suposições (RT 631⁄2001).

Ademais, a dessemelhança fática entre os acórdãos confrontados impede o prosseguimento dos embargos.

O acórdão paradigma, diante da premissa fática da existência de uma lesão que se renova ano a ano, afastou o prazo decadencial de 120 dias para o ajuizamento do mandado de segurança.

Já o aresto embargado reconheceu que a lesão apontada existiu no momento em que o contribuinte, por imposição fiscal, corrigiu o seu balanço, em 1989, pelo índice determinado pelo poder tributante, afastando a existência, no caso, de uma lesão que se renova anualmente.

Ante o exposto, não conheço dos embargos de divergência.


É como voto.



CERTIDÃO DE JULGAMENTO
PRIMEIRA SEÇÃO
Número Registro: 2004⁄0016115-5 ERESP 506798 ⁄ MG


Números Origem: 200300327963 9601472967

PAUTA: 12⁄05⁄2004 JULGADO: 12⁄05⁄2004


Relator
Exmo. Sr. Ministro CASTRO MEIRA

Presidenta da Sessão
Exma. Sra. Ministra ELIANA CALMON

Subprocuradora-Geral da República
Exma. Sra. Dra. GILDA PEREIRA DE CARVALHO BERGER

Secretária
Bela. MARIA AUXILIADORA RAMALHO DA ROCHA

AUTUAÇÃO

EMBARGANTE : ZAMBONI DISTRIBUIDORA LTDA
ADVOGADO : DALMAR DO ESPÍRITO SANTO PIMENTA E OUTROS
EMBARGADO : FAZENDA NACIONAL
PROCURADORA : MÁRCIA HENRIQUES RIBEIRO DE OLIVEIRA E OUTROS


ASSUNTO: Tributário - Imposto de Renda

CERTIDÃO

Certifico que a egrégia PRIMEIRA SEÇÃO, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

"Após o voto do Sr. Ministro Castro Meira (Relator) não conhecendo dos embargos, pediu vista antecipadamente o Sr. Ministro Luiz Fux."
Aguardam os Srs. Ministros Denise Arruda, Francisco Falcão, Franciulli Netto e Teori Albino Zavascki.
Ausentes, ocasionalmente, os Srs. Ministros Francisco Peçanha Martins, José Delgado e João Otávio de Noronha.

O referido é verdade. Dou fé.

Brasília, 12 de maio de 2004



MARIA AUXILIADORA RAMALHO DA ROCHA
Secretária

EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RESP Nº 506.798 - MG (2004⁄0016115-5)

VOTO-VENCEDOR


PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. TESE APRECIADA PELA PRIMEIRA SEÇÃO. MANDADO DE SEGURANÇA. DECADÊNCIA. CORREÇÃO MONETÁRIA DAS DEMONSTRAÇÕES FINANCEIRAS. CABIMENTO DO WRIT PREVENTIVO.
1. Embargos de Divergência versando questão decidida pela C. Primeira Seção no sentido do aresto apontado como paradigma merecem conhecimento, a fim de ensejar a pacificação da matéria meritória.
2. "Para que haja a impetração do mandado de segurança preventivo, não é necessário esteja consumada a situação de fato sobre a qual incide a lei questionada, bastando que tal situação esteja acontecendo, vale dizer, que tenha sido iniciada a sua efetiva formação ou pelo menos estejam concretizados fatos dos quais logicamente decorre o fato gerador do direito cuja lesão é temida.
Em mandado de segurança relativo a matéria tributária é imprescindível distinguir-se lesão de ameaça, pois tem-se admitido, a partir da mera presunção jurídica da aplicabilidade da lei, a impetração do mandado de segurança preventivo contra lei que, sem validade jurídica, cria ou aumenta tributo, utilizando-se raciocínio simplista de que a lei em si mesma já se traduz no ato impugnável e é a partir de sua vigência que deve se contar o prazo do extinção do mandamus, sem se levar em conta a ocorrência efetiva ou provável ocorrência da situação de fato que levará à incidência da norma, e que ensejará, assim, respectivamente, a impetração corretiva ou preventiva.
A tese jurídica discutida reporta-se a fato ocorrido em 1989, pela aplicação da Lei 7.799⁄89, quando foi usado índice de correção monetária no balanço daquele ano-base, tendo a ilegalidade se protraído no tempo, atingindo as empresas em 1992, quando apuraram resultado positivo e, portanto, tributável, sendo cabível, assim, a utilização do mandado de segurança preventivo, não atingido pela decadência."(ERESP 467.653-MG, Rel. Min. Eliana Calmon, DJ de 23.08.2004).
3. Embargos de Divergência conhecidos e providos.



O EXMO. SR. MINISTRO LUIZ FUX: Cuida-se de Embargos de Divergência opostos por ZAMBONI DISTRIBUIDORA LTDA. em face de acórdão prolatado pela Eg. Primeira Turma, de relatoria do em. Min. José Delgado, em lide versando a decadência para a impetração de Mandado de Segurança, em 1994, visando questionar diferenças de correção monetária havidas no balanço de 1989.

O em Min. Castro Meira relatou o feito nos seguintes termos:

Cuida-se de embargos de divergência contra acórdão da Primeira Turma, exarado no Recurso Especial 506.798⁄MG, assim sumariado:

"PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. CORREÇÃO MONETÁRIA DE BALANÇO. APROVEITAMENTO. PRAZO DECADENCIAL. INTELIGÊNCIA DO ART. 18, DA LEI Nº 1.533⁄51.
1. A incidência do prazo decadencial de 120 dias (art. 18, da Lei nº 1.533⁄51) obsta a utilização do writ, de vez que o termo a quo desse lapso temporal instalou-se à época em que as autoras tomaram conhecimento do ato dito coator.
2. Não basta rotular de 'preventivo' o mandado de segurança para se afastar o fenômeno processual da decadência do direito. É absolutamente inviável o socorro mandamental que visa utilizar, no ano de 1994, diferenças de correção monetária de balanço do ano de 1989.
3. Recurso especial não provido" (fl. 270).

A Primeira Turma, ao apreciar a questão dos autos relativa à correção monetária das demonstrações financeiras do ano-base 1989, entendeu que o recorrente decaiu do direito à impetração do mandado de segurança, ao argumento de ser "absolutamente inviável o socorro mandamental que visa utilizar, no ano de 1994, diferenças de correção monetária de balanço do ano de 1989".
Com o objetivo de comprovar a divergência, o embargante traz à colação arestos da Segunda Turma - especificamente, o REsp 188.082⁄MG e o REsp 204.111⁄RJ, Relatora para acórdãos a Ministra Eliana Calmon, este último assim ementado:

"PROCESSO CIVIL - MANDADO DE SEGURANÇA - DECADÊNCIA - CORREÇÃO MONETÁRIA DAS DEMONSTRAÇÕES FINANCEIRAS - LIQUIDEZ E CERTEZA DO DIREITO.
1. A tese jurídica discutida reporta-se a fato ocorrido em 1989, quando foi usado índice de correção monetária no balanço daquele ano-base.
2. Ilegalidade que se protrai no tempo, sendo este mandamus preventivo, por se reportar ao reflexo daquela ilegalidade.
3. Mandado de segurança não atingido pela decadência.
4. Tese jurídica que não exige exame dos aspectos fáticos, mas a constatação de que houve reflexo do índice de correção monetária da Lei 7.799⁄89 no balanço do ano de 1994.
5. Recurso especial provido" (STJ - 2ª Turma, REsp 204.111⁄RJ, Rel. para acórdão a Min. Eliana Calmon, J. por maioria em 25.06.2002, DJU de 25.11.2002).

Entendeu a Segunda Turma, no aresto paradigma, que o direito à impetração não se encontra fulminado pela decadência, já que a questão relativa à correção monetária das demonstrações financeiras do ano-base 1989 renova-se ano a ano, a cada nova declaração do Imposto de Renda.
Em sua impugnação, sustenta a Fazenda Nacional, em síntese, ser impossível o manejo do mandado de segurança com o objetivo de utilizar diferenças dos demonstrativos financeiros do período de 1989, no ano-base de 1994. Alega, também, que o acórdão não é digno de reparos, pois ultrapassado o prazo de 120 dias, o direito que se quer proteger poderá ser discutido por outra via judicial que não o writ. Segundo a embargada, não houve ofensa aos artigos 1º e 18 da Lei nº 1.533⁄51 e a admissibilidade do recurso encontra óbice na Súmula 168 do STJ. Por derradeiro, pugna pelo não-conhecimento dos embargos de divergência.
É o relatório


S. Exa. não conheceu dos Embargos, forte na seguinte fundamentação:

A controvérsia posta nos embargos de divergência versa sobre a incidência do prazo decadencial de 120 dias para o ajuizamento do mandado de segurança preventivo.
Do voto-condutor do acórdão embargado, proferido pela Primeira Turma, colhe-se o seguinte entendimento:

"Ao impetrar o writ, o objetivo das autoras não foi outro senão o de assegurar a utilização, no ano de 1994, da diferença verificada nos demonstrativos financeiros relativos ao período-base de 1989, decorrente de índice de atualização monetária que não refletiu a real inflação do período. Destarte, aspiram o direito de contabilizar em 1994, para efeito de determinação das bases de cálculo do IRPJ e da CSLL, a diferença havida pela não aplicação do IPC⁄IBGE na correção das demonstrações financeiras de 1989.
Em outras oportunidades, esta Corte já se manifestou sobre tema semelhante e o meu posicionamento continua sendo o mesmo. Confira-se:

(...)

Na via estreita do Mandado de Segurança, a contagem do lapso decadencial se faz a partir do momento que se deseja amparar.
Segundo as lições do mestre Pontes de Miranda “se há ameaça e cessa, certamente não se pode argüir a ameaça que foi há mais de cento e vinte dias; pode-se argüir posteriormente, dentro do prazo de cento e vinte dias, qualquer ameaça posterior” (Comentários à Constituição, 1946, 2ª ed., vol. IV).
Depreende-se dos julgados reiterados desta Corte, a respeito do prazo decadencial para o ajuizamento da ação mandamental, que:
a) a partir do ato lesivo abre-se o prazo de 120 dias para a impetração;
b) do pedido não poderá constar direito excedente ao prazo de 120 dias anteriores ao ajuizamento do mandamus;
c) o direito localizado em momento anterior aos 120 dias poderá ser discutido por outra via judicial, que não o writ.
Desfigurada estaria a própria Lei do Mandado de Segurança se se pudesse perquirir atos anteriores ao prazo de 120 dias, o que conduziria ao absurdo de ficar em aberto a possibilidade de busca de proteção a atos ocorridos há meses, anos ou décadas pela via constitucional.
Se as autoras elegeram a via do mandamus para buscar proteção ao direito vindicado, devem estar conscientes de que ficam submetidas ao normativo que disciplina tal instituto – a Lei 1.533⁄51 –, não prejudicada a possibilidade da via ordinária se o pleito não lograr êxito.
Cada ato está submetido a um prazo decadencial. Entendimento diverso implicaria a atribuição de efeitos pretéritos à ação mandamental, o que é inviável. E é exatamente o que se identifica no presente caso, como exposta a pretensão pelas impetrantes desde a inicial.
Frise-se: o mandado de segurança é remédio adequado para afastar ofensa presente ou iminente a direito individualizado, particularizado, identificável, ou seja, retentor de plano dos pressupostos de liquidez e certeza exigidos pela lei.
Há, portanto, que ser repelida a apontada ofensa ao teor dos artigos 1º e 18 da Lei 1.533⁄51, dado à manifesta ausência de caráter preventivo da ação ajuizada.
Não basta rotular de “preventivo” o writ para se afastar o fenômeno processual da decadência do direito. É absolutamente inviável o socorro mandamental que visa utilizar, no ano de 1994, diferenças de correção monetária de balanço do ano de 1989.
Em se tratando de mandado de segurança preventivo, sem divergências, o entendimento expressado por esta Corte é na linha de que inexiste aplicação do prazo decadencial de 120 dias previsto na legislação infraconstitucional (art. 18 da Lei nº 1.533⁄51). Há variedade de precedentes e mais nenhuma discussão:
(...)

Ocorre que, como demonstrado, na espécie, a lesão apontada existiu no momento em que o contribuinte, por imposição fiscal, corrigiu o seu balanço, em 1989, pelo índice determinado pelo poder tributante.

Posto isso, nego provimento ao recurso ora examinado.

É o voto" (fls. 264⁄268).

Para confrontar a orientação preconizada nesse aresto, a embargante traz a colação o acórdão exarado no REsp 204.111⁄RJ, proferido pela Segunda Turma. Revela-se conveniente, para uma melhor compreensão da divergência, transcrever o voto-vista da Min. Eliana Calmon, senão vejamos:

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