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domingo, 6 de janeiro de 2008

MS 8.866/DF - TRANSCURSO DO PRAZO DE 120 DIAS. DECADÊNCIA CONFIGURADA. GERAL DIRIGIDA A TODOS OS FORNECEDORES DE PRODUTOS AO CONSUMIDOR.

MANDADO DE SEGURANÇA Nº 8.866 - DF (2003⁄0003611-7)
RELATOR : MINISTRO LUIZ FUX
IMPETRANTE : NISSAN DO BRASIL AUTOMÓVEIS LTDA
ADVOGADO : ALEXANDRE KRUEL JOBIM E OUTROS
IMPETRADO : MINISTRO DE ESTADO DA JUSTIÇA

EMENTA
ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. PORTARIA DO MINISTÉRIO DA JUSTIÇA Nº 789⁄01. TRANSCURSO DO PRAZO DE 120 DIAS. DECADÊNCIA CONFIGURADA. NORMA GERAL DIRIGIDA A TODOS OS FORNECEDORES DE PRODUTOS AO CONSUMIDOR. APLICAÇÃO DA SÚMULA 266⁄STF. IMPOSSIBILIDADE DE MANDADO DE SEGURANÇA CONTRA LEI EM TESE.
1. O mandado de segurança subordina-se ao prazo decadencial de 120 (cento e vinte) dias a contar da ciência do ato abusivo.
2. Impõe-se decretar a decadência do direito de impetrar mandado de segurança, na hipótese em que a Portaria (789⁄01), ora inquinada como ilegal, foi editada em 24 de agosto de 2001, e publicada em 27 de agosto de 2001, sendo que o presente mandado de segurança somente foi impetrado em 20 de janeiro de 2003.
3. É desinfluente ao prazo decadencial a ocorrência de fato concreto, verificável pelo impetrante na economia de seus negócios, ensejador da incidência da Portaria, porquanto o writ dirige-se contra o ato normativo em si.
4. É incabível mandado de segurança contra a lei em tese. Consoante assentado pelo parquet:"(...) in casu, existem atos emanados da própria administração que em seu conteúdo, por terem caráter geral, abstrato e impessoal, devem ser entendidos como lei de efeitos abstratos, impassível, assim, de exame via mandado de segurança, sem que se aponte um ato concreto acarretador da emergência do direito líquido e certo. Tais condições (como é o caso do art. 2º da Portaria nº 789⁄01) dizem respeito à lei em tese, porque se dirige à coletividade como um todo, e, como tal, não pode, por si só, atingir situações individuais. Frisa-se, no entanto, a possibilidade de que tal norma, em sua execução concreta, ensejar esta ou aquela obrigação a nível individual; mas então, não será a lei (lato sensu) em si que será guerreada, mas sua projeção na esfera individual.

5. Norma geral, dirigida a todos os fornecedores de produtos ao consumidor, não pode ser atacada via mandado de segurança, em face da disposição contida na Súmula 266⁄STF, que afasta a possibilidade de ação mandamental contra lei em tese.
6. Precedentes jurisprudenciais.
7. Mandado de segurança extinto, ressalvado o acesso às vias ordinárias ou outro writ tempestivo, diante da execução de ato concreto, onde o impetrante poderá invocar os vícios da Portaria.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, julgar extinto o processo, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros João Otávio de Noronha, Teori Albino Zavascki, Castro Meira, Denise Arruda, Francisco Peçanha Martins, José Delgado, Francisco Falcão e Franciulli Netto votaram com o Sr. Ministro Relator.
SUSTENTOU, ORALMENTE, A DRA. VANESSA MINEKAVA, PELA IMPETRANTE.

Brasília (DF), 10 de março de 2004 (Data do Julgamento)


MINISTRO LUIZ FUX
Relator


MANDADO DE SEGURANÇA Nº 8.866 - DF (2003⁄0003611-7)



RELATÓRIO




EXMO. SR. MINISTRO LUIZ FUX (Relator): NISSAN DO BRASIL AUTOMÓVEIS LTDA impetrou Mandado de Segurança, com pedido de medida liminar, contra ato do Excelentíssimo Senhor Ministro de Estado da Justiça, consubstanciado na Portaria nº 789⁄2001, que regulamentou o art. 10, § 1º, do Código de Defesa do Consumidor, e determinou, por conseguinte, a prévia comunicação de recall, por escrito, ao Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor - DPDC, à Secretaria de Direito Econômico - SDE, do Ministério da Justiça, aos PROCONS e demais autoridades competentes (art. 2º).

A impetrante sustenta que:

"Ao regulamentar o recall, a Portaria nº 789⁄01 assim dispôs em seu artigo

"Art. 2º. O fornecedor de produtos e serviços que, posteriormente à sua introdução no mercado de consumo, tiver conhecimento da periculosidade ou nocividade que apresentem, deverá imediatamente comunicar o fato, por escrito, ao Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor - DPCD, da Secretaria de Direito Econômico - SDE, do Ministério da Justiça, aos PROCONs, bem como a todas as demais autoridades competentes."(g.n.)

A ilegalidade e abusividade dessa exigência está na parte grifada do dispositivo legal acima transcrito.

De fato, ao estender a obrigatoriedade da comunicação aos "PROCONS e demais autoridades competentes", a Portaria nº 789⁄01:

a) violou a repartição constitucional de competências dos entes federativos; e

b) violou o princípio da legalidade, por criar obrigação sem comando definido e pretender sancionar o seu descumprimento.

(...)

Nesse contexto, resta claro que viola a repartição constitucional de competências um ato meramente regulamentar, infralegal (em verdade, de hierarquia inferior a decreto), emanado de autoridade administrativa federal - como é o caso da Portaria nº 789⁄01 - que crie obrigação perante órgãos pertencentes a outros entes da Federação.

Nesse caso, caberia aos Estados e Municípios, que assim o quisessem, definir a atribuição de seus órgãos para recebimento da comunicação prevista no artigo 10, § 1º, do Código de Defesa do Consumidor, criando a obrigação correspondente para os particulares.

A propósito, importa frisar que o artigo 10, § 1º, do Código de Defesa do Consumidor refere-se apenas à comunicação do fato "às autoridades competentes" sem dizer quais são elas.

E não poderia ser diferente. Isso porque, conforme o exposto, cada ente da Federação é competente para determinar, dentro de sua estrutura administrativa, qual a autoridade competente para o recebimento de tal comunicação.

A Portaria nº 789⁄01, portanto, deveria ter se restringido a indicar, em seu artigo 2º, o DPDC como a autoridade competente para tanto no âmbito federal."


Acentua, ainda, que houve violação ao princípio constitucional da legalidade, porquanto criou obrigação sem comando definido.

A medida liminar pleiteada foi deferida pelo Eminente Ministro Edson Vidigal, no exercício da Presidência da Corte, tendo sido posteriormente integrada pelo decisum proferido em sede de embargos de declaração, que esclareceu que o deferimento da liminar afasta a obrigatoriedade imposta pela parte da norma contida no art. 2º da referida Portaria 789⁄01, quanto aos PROCONS ou equivalentes no âmbito municipal, assim como à expressão "a todas as demais autoridades competentes".

Foram prestadas as informações de estilo às fls. 102⁄113.


O Ministério Público Federal opinou pela denegação da ordem, em parecer assim ementado:

"MANDADO DE SEGURANÇA. ADMINISTRATIVO. LEI EM TESE. EFEITOS ABSTRATOS. PORTARIA Nº 789⁄01. ALEGAÇÃO DE SUPOSTA ILEGALIDADE E ABUSIVIDADE DO ATO REGULAMENTADOR. ART. 2º. NÃO OCORRÊNCIA. PARECER PELO NÃO CONHECIMENTO E, CASO ADMITIDO, PELA DENEGAÇÃO DA SEGURANÇA."(fl. 128)

É o relatório.

MANDADO DE SEGURANÇA Nº 8.866 - DF (2003⁄0003611-7)

ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. PORTARIA DO MINISTÉRIO DA JUSTIÇA Nº 789⁄01. TRANSCURSO DO PRAZO DE 120 DIAS. DECADÊNCIA CONFIGURADA. NORMA GERAL DIRIGIDA A TODOS OS FORNECEDORES DE PRODUTOS AO CONSUMIDOR. APLICAÇÃO DA SÚMULA 266⁄STF. IMPOSSIBILIDADE DE MANDADO DE SEGURANÇA CONTRA LEI EM TESE.
1. O mandado de segurança subordina-se ao prazo decadencial de 120 (cento e vinte) dias a contar da ciência do ato abusivo.
2. Impõe-se decretar a decadência do direito de impetrar mandado de segurança, na hipótese em que a Portaria (789⁄01), ora inquinada como ilegal, foi editada em 24 de agosto de 2001, e publicada em 27 de agosto de 2001, sendo que o presente mandado de segurança somente foi impetrado em 20 de janeiro de 2003.
3. É desinfluente ao prazo decadencial a ocorrência de fato concreto, verificável pelo impetrante na economia de seus negócios, ensejador da incidência da Portaria, porquanto o writ dirige-se contra o ato normativo em si.
4. É incabível mandado de segurança contra a lei em tese. Consoante assentado pelo parquet:"(...) in casu, existem atos emanados da própria administração que em seu conteúdo, por terem caráter geral, abstrato e impessoal, devem ser entendidos como lei de efeitos abstratos, impassível, assim, de exame via mandado de segurança, sem que se aponte um ato concreto acarretador da emergência do direito líquido e certo. Tais condições (como é o caso do art. 2º da Portaria nº 789⁄01) dizem respeito à lei em tese, porque se dirige à coletividade como um todo, e, como tal, não pode, por si só, atingir situações individuais. Frisa-se, no entanto, a possibilidade de que tal norma, em sua execução concreta, ensejar esta ou aquela obrigação a nível individual; mas então, não será a lei (lato sensu) em si que será guerreada, mas sua projeção na esfera individual.
5. Norma geral, dirigida a todos os fornecedores de produtos ao consumidor, não pode ser atacada via mandado de segurança, em face da disposição contida na Súmula 266⁄STF, que afasta a possibilidade de ação mandamental contra lei em tese.
6. Precedentes jurisprudenciais.
7. Mandado de segurança extinto, ressalvado o acesso às vias ordinárias ou outro writ tempestivo, diante da execução de ato concreto, onde o impetrante poderá invocar os vícios da Portaria.





VOTO

EXMO. SR. MINISTRO LUIZ FUX (Relator): Preliminarmente, verifica-se, in casu, óbice intransponível a fim de possibilitar o acolhimento da irresignação via ação mandamental.

Com efeito, dispõe textualmente o art. 18 da Lei 1.533⁄51:

"Art. 18. O direito de requerer mandado de segurança extinguir-se-á decorridos cento e vinte dias contados da ciência, pelo interessado, do ato impugnado."

In casu, a Portaria nº 789 do Ministro de Estado da Justiça, ora inquinada como ilegal, foi editada em 24 de agosto de 2001, tendo sido publicada em 27 de agosto de 2001 (fl. 29), o que revela notório transcurso do prazo decadencial de 120 (cento e vinte) dias para fins de utilização da via mandamental, porquanto o presente mandado de segurança foi impetrado em 20 de janeiro do corrente ano (fl. 02).

Nesse sentido, os seguintes julgados:

"PROCESSO CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. DECADÊNCIA. LEI 1.533⁄51, ART. 18.
O prazo para impetração de mandado de segurança é de cento e vinte dias, contados, no caso, a partir da publicação da portaria ministerial tida como coatora.
Estabelecendo a Portaria n.º 558, firmada pelo Ministro de Estado da Política Fundiária e de Desenvolvimento Agrário, restrição à propriedade particular, presume-se que tenha gerado efeitos concretos a partir de sua publicação no Órgão oficial.
Agravo improvido."(AGRMS 6893⁄DF, Rel. Min. Castro Filho, DJ 25⁄06⁄2001)

"PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. PORTARIA MINISTERIAL QUE DEMARCOU TERRAS INDÍGENAS. ATO ADMINISTRATIVO DE EFEITOS CONCRETOS. INTEMPESTIVIDADE DA IMPETRAÇÃO. DECADÊNCIA.
I - O prazo de decadência do direito de agir na ação mandamental começa a fluir a partir do momento em que o ato malsinado se torna eficaz, com a devida ciência daqueles por ele atingidos.
II - Ao caso, verifica-se que já escoou o prazo decadencial para a impetração do mandado de segurança, porquanto o ato administrativo impugnado, produziu seus efeitos concretos, uma vez que, cientes de seu conteúdo, os Autores permaneceram inertes.
III - Prazo compreendido no lapso temporal de cento e vinte dias, peremptório e decadencial. O direito não socorre aqueles que adormecem.
IV - Mandado de segurança a que não se conhece."(MS 5109⁄DF, Rel. Min. Laurita Vaz, DJ 24⁄09⁄2001)

Deveras, consoante bem observado pelo Eminente representante do parquet Federal, Dr. Francisco Adalberto Nóbrega, revela-se inviável, in casu, o presente mandado de segurança, porquanto volta-se contra norma de caráter geral e abstrato. Do elucidativo parecer, merece destaque o seguinte excerto:

"Preliminar e crucial ao exame meritório, urge um exame mais detido acerca da revivente discussão acerca da admissibilidade, ou não, do mandado de segurança contra a lei em tese ou outros atos simplesmente normativos baixados pela Administração Pública.

De acordo com Humberto Theodoro Júnior, "a justiça, dentro da tripartição de poderes do Estado democrático atual, não pode imiscuir-se nem na atividade legislativa, nem na atividade administrativa, desempenhada pelos outros dois poderes que integram a soberania, a não ser quando suas deliberações caiam no plano concreto dos atos de execução que atingem a esfera dos interesses individuais, onde, aí sim, torna-se possível a configuração de lides ou litígios, cuja solução, constitucionalmente, toca ao Poder Judiciário".

Por essa razão, no que tange aos atos emanados do Legislativo, conquanto possa ser o mandado de segurança preventivo (justificado pela ameaça da violação ao direito), não pode ser normativo, quer dizer, não pode funcionar como norma geral, utilizável em casos futuros análogos. Caso contrário, se o mandado de segurança pudesse ter efeitos normativos, gerais, estaria o Judiciário, em certa medida operando como legislativo, usurpando, portanto, a competência de outro Poder.

Nessa esteira de conhecimento, pelo escólio de Rodolfo de Camargo Mancuso, conclui-se não servir o mandado de segurança para atacar as normas abstratas e gerais em si mesmas. A fortiori por duas características da lei (lato sensu) a novidade e a generalidade (quanto a esta última, já o Direito Romano prescrevia: lex est commune praeceptum) é incabível guerrear lei em tese.

Ainda sob as luzes do ministério do ilustre mestre, a lei, por definição, destina-se a regular certas situações ocorrentes na vida em sociedade, dispondo em forma geral, abstrata e impessoal, a todos alcançando o seu largo espectro coercitivo. Mas, há determinadas situações que apenas soem ser reguladas por lei (lato sensu), por mera exigência do processus legislativo e, não, porque o seu conteúdo ou a sua finalidade assim o exigissem. Em outros casos, a lei já traz embutida a sua executoriedade, de sorte que, desde sua entrada em vigor, ela passa a produzir efeitos concretos sobre o segmento social a que veio afetada; bem por isso, a essas se convencionou denominar "leis de efeitos concretos".

Autorizado arauto da matéria em apreço é o saudoso Hely Lopes Meirelles, ao preceituar que só se admite mandado de segurança contra atos meramente normativos (lei em tese), contra a coisa julgada e contra os interna corporis de órgãos colegiados. E as razões são óbvias para essas restrições: as leis e os decretos gerais, enquanto normas abstratas, são insuscetíveis de lesar direitos, salvo quando proibitivos. A lei em tese, como norma abstrata de conduta, não é atacável por mandado de segurança (STF, Súmula 206), pela óbvia razão de que não lesa, por si só, qualquer direito individual.
(...)
Doutro lado, como in casu, existem atos emanados da própria administração que em seu conteúdo, por terem caráter geral, abstrato e impessoal, devem ser entendidos como lei de efeitos abstratos, impassível, assim, de exame via mandado de segurança, sem que se aponte um ato concreto acarretador da emergência do direito líquido e certo. Tais condições (como é o caso do art. 2º da Portaria nº 789⁄01) dizem respeito à lei em tese, porque se dirige à coletividade como um todo, e, como tal, não pode, por si só, atingir situações individuais. Frisa-se, no entanto, a possibilidade de que tal norma, em sua execução concreta, ensejar esta ou aquela obrigação a nível individual; mas então, não será a lei (lato sensu) em si que será guerreada, mas sua projeção na esfera individual.

(...)
Afigura-se, portanto, inviável o socorro mandamental quando o impetrante fixa sua insurgência no conteúdo de uma norma revestida de caráter genérico e abstrato (art. 2º da Portaria nº 789⁄01), cuja finalidade é complementar dispositivo disposto alhures (CDC art. 10, § 1º), a teor do enunciado sumular nº 266 do Colendo Supremo Tribunal Federal. Ficam descaracterizados, desta forma, os efeitos concretos, individuais e específicos ensejadores da suposta violação."(fls. 128⁄143)

In casu, a própria impetrante justifica a suposta abusividade do comando genérico contido na referida Portaria, porquanto, na data da impetração, verificou-se a necessidade de proceder a um recall dos veículos automotores vendidos ao consumidor.

Dessa assertiva, sobressai inequívoco que a impetração dirige-se contra uma norma geral e abstrata, voltada para todos os fornecedores de produtos ao consumidor.

Sobre o tema, elucidativo texto de Antônio César Bochenek, in Aspectos Polêmicos e Atuais do Mandado de Segurança 51 anos depois, São Paulo:RT, 2002. p. 77⁄79:

"Como afirma Nelson Nery, a "lei em tese é ato legítimo, emanado de autoridade legítima só é suscetível de ser atacado via mandamental, quando ferir direito individuais (concretizar efeitos). Enquanto abstrato e geral não enseja MS, porquanto é norma geral (lei em tese)".74 Isto leva ao entendimento de que a norma geral e abstrata não produz efeitos suscetíveis de lesar direitos subjetivos. A jurisprudência do antigo TRF era clara ao definir que lei em tese seriam normas de caráter genérico, insuscetíveis de lesar direitos individuais, existentes em leis, regulamentos e portarias.
Alerta Rodolfo Mancuso que nas leis de efeitos concretos é cabível mandado de segurança, visto que se trata de verdadeiros atos administrativos: "... a admissão de segurança contra as chamadas 'leis de efeitos concretos' são leis apenas na forma, mas em substância, são atos administrativos, tão-só revestidos de forma legal por imposição de caráter técnico-jurídico".
Em suma, é incabível mandado de segurança contra "lei em tese", pois o instituto constitucional só é meio idôneo para impugnar atos que causem efeitos concretos, ou seja, busca-se afastar a aplicação da lei no caso específico do impetrante; e, como a decisão produz efeitos apenas entre as partes, a lei continuará a ser aplicada às demais pessoas a que se dirige. Neste sentido a Súmula do STF 266 afirma: "Não cabe mandado de segurança contra lei em tese".
Todavia há exceções a esta regra, leis auto-executáveis, leis proibitivas e leis produtoras de efeitos concretos. Em se tratando de mandado de segurança em matéria tributária, é cabível a sua impetração antes do lançamento, visto que se impõe como obrigação do poder público, especificamente à autoridade administrativa fiscal competente de fazê-Io, sob pena de responsabilidade funcional. Estabelece-se uma presunção da incidência da norma tributária ameaçando o direito subjetivo do contribuinte que pode se socorrer do mandado de segurança a fim de não ver aplicada uma norma ti da por inconstitucional.

Mandado de Segurança Preventivo (Lei auto-executável, Lei proibitiva e Lei produtora de efeito concreto)

É oportuno considerar que o mandado de segurança, embora possa ter caráter preventivo quando há ameaça de violação ao bem jurídico, não pode ser normativo, ou seja, não pode funcionar como norma geral, utilizável em casos futuros e parecidos. Como salienta Rodolfo Mancuso, "... é preciso, sempre, resguardar-se a repartição de atribuições entre os Poderes constituídos e, ademais, para cada desiderato que se queira alcançar, haverá sempre o instituto jurídico adequado. Assim, se é a lei ou decreto que estão defasados, ou foram baixados com inobservância dos preceitos para sua formação, o caso será de reforma ou de revogação desses textos, conforme a gravidade dos vícios que os inquinem. Se o vício é de inconstitucionalidade, e de tal monta que se afigure necessário que dele tome conhecimento o Judiciário em via principal, há o recurso à argüição direta de inconstitucionalidade".
Destaque-se que nas leis formais e materiais, que sejam auto-executáveis, isto é, leis que violam direitos sem necessidade de qualquer ato posterior, é cabível o mandado de segurança, desde que se atente ao fato de que a decisão valerá só interpartes, e o seu efeito seria apenas de subtrair o autor da demanda aos efeitos da lei inconstitucional. A lei continuaria válida em relação a outros direitos do demandante que não tivessem sido deduzidos na ação. Neste caso, estas leis são consideradas como verdadeiros atos administrativos, portanto, passíveis de impetração de mandado de segurança.
Os atos da Mesa da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, assim como das Assembléias Legislativas e Câmaras dos Vereadores, são passíveis de impugnação por mandado de segurança, se forem ilegais ou abusivos. Neste caso, o impetrante será o membro da Casa Legislativa que tem seu direito líquido e certo violado.
Para Sérgio Ferraz é plausível, além da impetração do mandado de segurança contra atos normativos concretizados em regulamentos, leis etc. (menos em pareceres, conforme julgados do STJ), também a utilização do instituto constitucional de cunho preventivo, para assegurar ameaça de direito líquido e certo contra o projeto de lei proibitiva ou produtora de efeito concreto, ou, ainda, ensejador de inconstitucionalidade. Nesse mesmo sentido, afirma José da Silva Pacheco que "... os atos formal e materialmente legislativos, constituindo lei em tese, não admitem, por si, mandado de segurança, a não ser que inconstitucionais e houver ameaça ou violação de direito".
Deste modo, melhor entendimento é de que não é apropriado o mandado de segurança para atacar as normas abstratas e gerais, em si mesmas, segue-se que essa ação não é cabível para guerrear a "lei em tese". (grifo nosso)

3.2.3 Jurisprudência

"A lei em tese, enquanto ato legítimo emanado de autoridade legítima, só é suscetível de ser atacada via mandamental, quando ferir direitos individuais (concretizar efeitos). Enquanto abstrato e geral não enseja MS, porquanto é norma geral (lei em tese)" (STJ -1.aT. -RMS 761-GO -reI. Min. Pedro Acioli,j. 14.08.1991, DJU 16.09.1991, p. 12.620; STJ - l.a S - MS 488-DF - reI. Min. Américo Luz, j. 25.06.1991, DJU 19.08.1991, p. 10.971; RSTJ62⁄47); RTJ 158⁄103: "não cabe mandado de segurança contra lei em tese"; STF - RT 738⁄214; RSTJ 4⁄1.432;) (grifo nosso)


No que pertine às leis e decretos de efeitos concretos destacou Hely Lopes Meirelles, in “Direito Administrativo Brasileiro” (Malheiros, 2001, p. 669), litteris:

“(...)podem ser invalidados em procedimentos comuns, em mandado de segurança ou em ação popular porque já trazem em si os resultados administrativos objetivados...” porquanto não são“ atos normativos gerais, mas, sim, deliberações individualizadas revestindo a forma anômala de lei ou decreto. Tais são, p. ex., as leis que criam Município, as que extinguem vantagens dos servidores públicos, as que concedem anistia fiscal e outras semelhantes. Assim também os decretos de desapropriação, de nomeação, de autorização etc.”

E na obra de sua autoria intitulada “Mandado de Segurança, Ação Popular, Ação Civil Pública, Mandado de Injunção, Habeas Data, Ação Direta de Inconstitucionalidade, Ação Declaratória de Constitucionalidade e Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental”(Malheiros, 23ª ed, 200, p. 39) assim definiu as leis de efeitos concretos:
"o objeto do mandado de segurança será sempre a correção de ato ou omissão de autoridade, desde que ilegal e ofensivo de direito individual ou coletivo, líquido e certo, do impetrante.
Este ato ou omissão poderá provir de autoridade de qualquer dos três Poderes. Só não se admite mandado de segurança contra atos meramente normativos (lei em tese), contra a coisa julgada e contra os interna corporis de órgãos colegiados. E as razões são óbvias para essas restrições: as leis e os decretos gerais, enquanto normas abstratas, são insuscetíveis de lesar direitos, salvo quando proibitivos; a coisa julgada só é invalidável por ação rescisória (CPC, art. 485, e STF, SÚmula 268); e os interna corporis, se realmente o forem, não se sujeitam a correção judicial.
A lei em tese, como norma abstrata de conduta, não é atacável por mandado de segurança (STF, Súmula 266), pela óbvia razão de que não lesa, por si só, qualquer direito individual. Necessária se torna a conversão da norma abstrata em ato concreto para expor-se à impetração, mas nada impede que, na sua execução, venha a ser declarada inconstitucional pela via do mandamus. Somente as leis e decretos de efeitos concretos tornam-se passíveis de mandado de segurança, desde sua publicação, por equivalentes a atos administrativos nos seus resultados imediatos.
Vê-se, portanto, que o objeto normal do mandado de segurança é o ato administrativo especifico, mas por exceção presta-se a atacar as leis e decretos de efeitos concretos, as deliberações legislativas e as decisões judiciais para as quais não haja recurso capaz de impedir a lesão ao direito subjetivo do impetrante.
Por leis e decretos de efeitos concretos entendem-se aqueles que trazem em si mesmos o resultado específico pretendido, tais como as leis que aprovam planos de urbanização, as que fixam limites territoriais, as que criam municípios ou desmembram distritos, as que concedem isenções fiscais; as que proíbem atividades ou condutas individuais; os decretos que desapropriam bens, os que fixam tarifas, os que fazem nomeações e outros dessa espécie. Tais leis ou decretos nada têm de normativos; são atos de efeitos concretos, revestindo a forma imprópria de lei ou decreto por exigências administrativas. Não contêm mandamentos genéricos, nem apresentam qualquer regra abstrata de conduta; atuam concreta e imediatamente como qualquer ato administrativo de efeitos individuais e específicos, razão pela qual se expõem ao ataque pelo mandado de segurança.
omissis" (págs. 39⁄40)

Destarte, exatamente por atacar um ato geral, dirigido à coletividade fornecedora de produtos ao consumidor, é que não há, in casu, outro ato de autoridade que não seja a própria Portaria 789⁄2001, e, em assim sendo, verifica-se inequívoca a decadência do direito de impetrar a ação mandamental, porquanto a impetração ocorreu quase um ano e meio após a publicação da aludida Portaria.

Assim, tanto a decadência do direito de impetrar mandado de segurança, como a aplicação, in casu, da Súmula 266 do Colendo STF, que afasta a ação mandamental contra lei em tese, impõem a extinção do presente mandado de segurança com julgamento do mérito.
Lecionando sobre o tema, ao comentar a Súmula 261 do STF, Roberto Rosas:

"266.Não cabe mandado de segurança contra lei em tese.
A Constituição dá o mandado de segurança para proteger direito líquido e certo ameaçado por ilegalidade ou abuso de poder da autoridade. Portanto, o ato negativo ou comissivo constituir-se-á em oportunidade para a impetração.
Se a lei é constitucional, necessário se faz aguardar o ato da autoridade eivado de ilegalidade ou abuso de poder. Se é inconstitucional, o caminho é a representação, e não o mandado de segurança (RTJ 43⁄359, 46⁄1, 47⁄654, 41⁄334, 54⁄71 e 62⁄774).
O Tribunal de Justiça concedeu segurança para corrigir injustiças da lei em tese (RTJ 71⁄918).
Ocorre, no entanto, que, em certos casos, a lei inquinada ofende direito subjetivo, líquido e certo; logo, cabe o mandado de segurança contra essa lei em tese (RTJ 43⁄359, 46⁄1, 110⁄77, 109⁄925, 108⁄81 e 47⁄654; RE 81.847, RTJ 90⁄518). Não cabe o mandado de segurança quando o decreto revela-se ato normativo, ou com efeito normativo. Ao contrário, se é ato administrativo, com efeitos concretos, é possível o mandado de segurança (MS 21.125, RTJ 138⁄756) (Carlos Alberto Menezes Direito, Manual do Mandado de Segurança, 3a ed., p. 32)."

Forçoso, ainda, advertir que é cláusula encartada nos direitos e garantias individuais a defesa, pelo Estado Soberano, dos direitos do consumidor, art. 5º, inciso XXXII.

Desta sorte, nenhuma autoridade mais apropriada do que o Ministro da Justiça para editar norma geral com fim ao atingimento desse escopo da República Brasileira.

Ante o exposto, julgo extinto o presente mandado de segurança, ressalvado à impetrante o acesso às vias ordinárias ou outro writ tempestivo, diante de ato concreto da Administração.

É como voto.


CERTIDÃO DE JULGAMENTO
PRIMEIRA SEÇÃO
Número Registro: 2003⁄0003611-7 MS 8866 ⁄ DF


PAUTA: 10⁄03⁄2004 JULGADO: 10⁄03⁄2004


Relator
Exmo. Sr. Ministro LUIZ FUX

Presidenta da Sessão
Exma. Sra. Ministra ELIANA CALMON

Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. FLAVIO GIRON

Secretária
Bela. MARIA AUXILIADORA RAMALHO DA ROCHA

AUTUAÇÃO

IMPETRANTE : NISSAN DO BRASIL AUTOMÓVEIS LTDA
ADVOGADO : ALEXANDRE KRUEL JOBIM E OUTROS
IMPETRADO : MINISTRO DE ESTADO DA JUSTIÇA


ASSUNTO: Administrativo - Ato - Portaria - Suspensão

SUSTENTAÇÃO ORAL

SUSTENTOU, ORALMENTE, A DRA. VANESSA MINEKAVA, PELA IMPETRANTE.
CERTIDÃO

Certifico que a egrégia PRIMEIRA SEÇÃO, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

"A Seção, por unanimidade, julgou extinto o processo, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator."
Os Srs. Ministros João Otávio de Noronha, Teori Albino Zavascki, Castro Meira, Denise Arruda, Francisco Peçanha Martins, José Delgado, Francisco Falcão e Franciulli Netto votaram com o Sr. Ministro Relator.

O referido é verdade. Dou fé.

Brasília, 10 de março de 2004



MARIA AUXILIADORA RAMALHO DA ROCHA
Secretária

Documento: 460164 Inteiro Teor do Acórdão - DJ: 05/04/2004

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